Município rende homenagens ao velho carteiro, que é alvo de admiração e respeito na Região dos Inhamuns
Aiuaba. Recentemente, este município comemorou, com uma grande festa, o centenário de uma figura histórica da região, o funcionário aposentado dos Correios, Raimundo Santiago de Oliveira. A festa começou com uma missa em ação de graças, na Igreja Matriz, seguida de recepção no Centro de Referência da Assistência Social (Cras). Familiares, amigos e admiradores fizeram questão de comparecer à celebração religiosa e a festa comemorativa aos 100 anos do "Senhor Guerreiro", como ele é conhecido.Na festa do centenário do carteiro, grande número de pessoas lhe cumprimentou por ser querido e admirado. Lúcido gosta de lembrar do tempo que, sem internet, as notícias chegavam aos destinatários pelas cartas FOTO: SILVANIA CLAUDINO
Casado duas vezes, 11 filhos, 70 netos, 35 bisnetos e sete tataranetos, a família faz dele um ser feliz, conforme diz, e está sempre agradecendo a Deus pela vida e pela saúde. Aposentou-se em 1974. Seus familiares estão espalhados pelo Brasil afora e muitos vieram para Aiuaba participar do momento de graça e de louvor. Familiares próximos residentes no Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Goiânia, Pernambuco e, especialmente, de Fortaleza, também vieram para esse momento festivo e histórico.
Lúcido, Raimundo Santiago recorda o tempo em que trabalhou como carteiro na região. É o último carteiro viajante do Estado. Conta histórias engraçadas desse período em que cruzou o Sertão dos Inhamuns entregando correspondências e encomendas, em tempos que, sequer, se cogitava em internet, e-mails e redes sociais.
As notícias de namorados ou namoradas e mais aquelas que falavam dos entes queridos em terras distantes somente chegavam pelas cartas, aguardadas ansiosamente pelos destinatários nos confins do Brasil.
Pacotes
Lembra que chegava a andar três dias a pé com pacotes de encomendas e de cartas no lombo de um burro, em viagens constantes para os municípios de Aiuaba, Cariús, Jucás e Saboeiro. Viajava a pé, se hospedava nas residências no meio do sertão. No entanto, a hospitalidade sertaneja e mais o seu carisma pessoal faziam com que sempre fosse bem recebido pelas pessoas que lhe acolhiam e ofereciam suas refeições.
Depois de muitos anos de caminhada e depois no lombo de um animal, é que a vida de carteiro melhorou. Em 1960 passou a andar de carro. Além de carteiro, foi agente em Aiuaba, Saboeiro e Iguatu.
Marcas
Nessas viagens, muitas coisas aconteceram que ficaram marcadas em sua trajetória de vida, pautada na honradez e dignidade e na sua memória. Enfrentou preconceitos quando a sociedade local não queria que negros dançassem no meio da elite.
Raimundo Santiago herdou o apelido do pai, Raimundo Ferreira Lima, conhecido pela bravura e destemor. O pai era firme e temido, uma espécie de cangaceiro, como muitos daquela época. Ele diz que sempre se voltou para o trabalho.
"Sempre fui trabalhador, da roça, e até hoje preservo o meu nome, a minha história de coragem, moral, sem falta", afirma orgulhoso o ancião.
Comemorando os 100 anos do Senhor Guerreiro, sua saga será contada em livro, cujo lançamento se dará ainda este ano, pelo professor João Álcimo Viana, historiador, cordelista, poeta e atual secretário de Educação de Tauá. Álcimo e seu ex-aluno, Tarcísio Mota, colheram fatos que narram a trajetória do Guerreiro, que tantos serviços relevantes prestou à região e preparam essa homenagem, a fim de registrar definitivamente na história da região dos Inhamuns.
Apesar dos desafios que enfrentava no cotidiano de sua profissão, o Senhor Guerreiro fez jus à função que assumiu nos idos de 1932. Percorria o sertão com determinação e coragem. Os perigos da insegurança e da dificuldade de transporte eram superados com ousadia.
Trabalhava dia e noite e como "naquela época havia segurança e as pessoas não assaltavam, matavam e roubavam o que não lhes pertencia, não tinha medo de andar à noite", lembra.
Funcionário dedicado, Senhor Guerreiro conta que gostava do que fazia e jamais teve uma falta em seu serviço. Teve três férias prêmios, porém não gozou nenhuma a fim de contar pontos em sua aposentadoria.
Antes dos Correios, ganhava a vida na agricultura e o emprego no órgão veio por acaso. Em 1932, o condutor de malas José Inácio largou o trabalho.
A agente na época, Branca Amélia Firmeza, convidou o Senhor Guerreiro para a função e ele aceitou na hora. Lembra que muitos outros recusaram o trabalho. "Era arriscado, pesado e exigia responsabilidade". Ele não se ligou nas dificuldades e abraçou o convite e a função.
Música
Ativo, o Senhor Guerreiro não incursionou apenas pelo universo da agricultura e comunicação. Fundou em 1958, a primeira Banda de Música de Aiuaba, composta por mulheres, intitulada "As meninas do Guerreiro".
Mais informações:
Prefeitura de Aiuaba
Centro Administrativo
Rua Niceias Arrais, 128
Telefone: (88) 3524.1102
www.aiuaba.ce.gov.br
REPÓRTERSILVANIA CLAUDINO
Materia publicada em: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1194982
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